ISSN 2179-1287
Número 6 | out/nov/dez 2011

Paisagens do semiárido do Nordeste brasileiro

Antonio Carlos de Barros Corrêa
Lucas Costa de Souza Cavalcanti

A diversidade das terras secas do Brasil

foto_06_01O semiárido brasileiro compreende uma área de 969.589 km² entre o norte do Estado de Minas Gerais e o Nordeste do Brasil. Nessa região, a precipitação pluviométrica média é inferior a 800mm anuais e um risco de seca maior que 60%.

Nesse sistema ambiental de precipitações escassas, a estação chuvosa é concentrada, e as temperaturas elevadas o ano inteiro. Isso resulta na formação de um relevo especial, no qual a erosão inicia-se com a intensidade da insolação e a variação diurna da temperatura sobre os afloramentos de rocha. A baixa umidade subterrânea retarda o processo de formação de solos, sendo predominante a ação do escoamento da água pelas vertentes com forte intensidade, o que resulta na suavização do relevo em forma das rampas (pedimentos). A evapotranspiração é intensa, e a infiltração da água pouco profunda.

Nessa região, as paisagens apresentam uma diversidade espetacular e tão pouco conhecida quanto sua biodiversidade. Ao longo dessas terras secas, planaltos e depressões se alternam e exercem forte influência sobre aquilo que um observador atento pode diferenciar em termos de variedade de formas de relevo, solos, vegetação e até de climas locais.

Entre planaltos e depressões

foto_06_02Os planaltos guardam regimes de chuva mais abundante, geralmente acima dos 800mm anuais, fato que se reflete na formação de solos mais desenvolvidos, bem como sobre as comunidades vegetais, onde podem ser comuns espécies dos domínios florísticos da Mata Atlântica e do Cerrado. Essas áreas cuja vegetação é determinada pela maior altitude do relevo são denominadas orobiomas. Curiosamente, o Planalto da Borborema (localizado entre os estados de Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte), cujas rochas que o formam foram raízes de uma antiga cordilheira há cerca de 600 milhões de anos atrás, teria assumido sua configuração atual com auxílio de uma atividade magmática recente, que resultou, inclusive, em vulcanismo no Rio Grande do Norte (Pico do Cabugí). Nessa área, é comum a ocorrência de vales escalonados e dos pontos de maior altitude na região, como o Pico do Papagaio, no município de Triunfo (PE).

A depressão sertaneja surge como uma vastidão de terras aplainadas interrompidas por súbitos morros isolados, compostos de rochas mais resistentes que as do entorno rebaixado. Essas rochas constituem verdadeiros maciços residuais, que emergem na paisagem isoladamente ou em conjuntos, sendo denominadas, na literatura geográfica, como inselbergues ou inselgebirgues, respectivamente. Nessa região natural, os solos são pouco desenvolvidos, e os afloramentos de rocha, constantes. A vegetação assume o caráter imposto pelo ambiente de baixa precipitação (geralmente entre 250mm e 600mm anuais), sendo comuns a ocorrência de cactáceas, bromeliáceas e toda sorte de plantas adaptadas aos rigores de uma paisagem de semiaridez severa.

Nas depressões, a drenagem possui caminhos preferenciais, todavia sem canais profundos e bem definidos. Quase sempre, essa região apresenta solos rasos e de baixa capacidade de infiltração, o que torna comum a ocorrência de verdadeiras enchentes relâmpago (flash floods) durante os grandes eventos de chuva.

foto_06_03Para além dos planaltos cristalinos e depressões, a paisagem do semiárido brasileiro é marcada pela configuração espetacular dos planaltos sedimentares, tal como a Chapada do Araripe e do Jatobá. Essas áreas dominaram grande parte do que hoje se chama o Nordeste do Brasil, tendo sua área reduzida a partir da abertura do Oceano Atlântico, que reorientou a drenagem, removendo os sedimentos antigos e revelando a superfície plana que se encontrava abaixo dos mesmos: a atual Depressão Sertaneja. O que restou dessa antiga superfície sedimentar está aprisionado em falhas geológicas, tais como a bacia do Recôncavo-Tucano-Jatobá, entre os estados da Bahia, Sergipe, Alagoas e Pernambuco.

Nesses terrenos arenosos, o estresse ambiental sobre a vegetação é grande, provocando a ocorrência de espécies características dessas áreas, a exemplo do Caxacubrí (Pilosocereus tuberculatus (Werderm.) Byles & Rowley).

Contudo, em função da própria geomorfologia dos planaltos sedimentares, suas bordas tendem a guardar brejos de pé de serra, com vegetação mais densa, adaptada à umidade local. Essas áreas são marcadas por escarpas de grande beleza cênica e feições ruiniformes, derivadas da erosão da escarpa do planalto ao longo do tempo geológico.

As paisagens do semiárido encantam por sua estética rústica e nos conduzem por uma viagem a terras secas de caráter único no mundo. Pelos planaltos e depressões, jazem histórias ainda por contar, histórias de rochas e solos e plantas e paisagens.

Para saber mais

AB’SABER, A. N. (2005) Os Domínios de Natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo: Ateliê Editorial, 3ª edição, 159 p.

ANDRADE-LIMA, D. A. (1981) The caatinga dominium. Rev. Bras. Bot. Rio de Janeiro, v.4, n.1, p. 149-153.


Antonio Carlos de Barros Corrêa
Professor de Geomorfologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pesquisador da história das paisagens semiáridas.
Lucas Costa de Souza Cavalcanti
Doutorando em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

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